Deodato Santos - Artista? Figurinista? Escultor?

Sou desmesuradamente exigente para com a arte: desejava que ela trouxesse uma resposta. Senão para uma pessoa pelo menos para a humanidade. Por isso nunca me atrevi a chamar-me artista: certa vez chamei-me figurinista, porque faço figuras, hoje nem isso”.

Perceber, à conversa, quem é o Deodato artista, não é fácil. Não só porque é sempre difícil reduzir a palavras simples a obra, o sentir e o pulsar daqueles que operam no universo das artes como é difícil interpretar a sua mensagem em linguagem corrente. E talvez deva ser assim, porque se fosse fácil esse diálogo e esse entendimento, ficaria desmobilizada a manifestação artística por desnecessária. No fim de contas, será mais clara e precisa a obra artística do que as palavras da entrevista. Da entrevista possível, com poucas perguntas e mais desafios, deixamos o excerto da digressão do autor ao sabor da sua plena liberdade.
Deodato Santos veio cá parar “via nascimento”, em 1939, como ele próprio referiu, portanto é lacobrigense de gema. Aqui iniciou os seus estudos; do Curso Industrial e do Comercial guarda na memória duas figuras determinantes na sua vida. O Mestre Américo, seu professor de carpintaria, que lhe passou os “segredos” da madeira que, mais tarde, adaptaria às suas esculturas. No Curso Comercial conheceu Zeca Afonso que veio a constituir uma forte influência no que à escrita diz respeito, marcando indelevelmente tudo o que daí para a frente foi escrevendo.
Da sua vida na grande Lisboa destaca a habitação em Sintra e o trabalho na Amadora, a sua ligação ao ensino, como professor de desenho. Paralelamente mantinha uma crónica semanal no Jornal “Notícias da Amadora”, coisa que lhe dava especial prazer. Foi nesta terra que apresentou a sua primeira escultura e foi aqui que Artur Bual lhe chamou escultor, a primeira vez que alguém assim o tratara.

Com alguns anos divididos entre Paris e Genebra, voltou depois a Portugal e a Lagos, nas vésperas do Maio de 68. Ensaiou a agricultura e mais tarde regressou ao ensino, à escultura e à escrita que, na verdade, nunca abandonou.
Hoje entende que atingiu um patamar da sua existência em que já não olha para a escultura como uma necessidade financeira, ou seja, não produz peças com urgência de as vender. Fá-las pelo prazer de as ver nascer e “ganhar vida”.
Da sua terra, neste início do novo milénio, Deodato diz que aqui se respira um ambiente envolto em variadas manifestações artísticas de elevado potencial, ambiente a que se deveria dar mais atenção. Música, teatro, artes plásticas, exposições (como A MALA), podiam e deviam ter outra projecção. E falta um espaço de encontro da arte, um local onde se possa comunicar sobre a arte. Ou falta criar esse hábito nalgum espaço já existente. Porque é necessário e imperativo comunicar ideias e criar acção. Para este artista, escultor, figurinista, a língua está sem alma e cheia de clichés, impossibilitada para a criação dinâmica, sendo no entanto um dos seus importantes atributos. Por isso dinamiza essa vertente no blogue Lagos, publicando conversas e reflexões com os mais variados artistas.
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Entrevista: Alexandra Craveirinha
Fotos: Francisco Castelo

Comentários

deodato santos disse…
2 correções: em maio 68 deixara paris por genebra. em 73 é que regressei a lagos.
"figurinista" dá a ideia que fazia figurinos, coisa que nunca fiz. o que eu queria dizer era "figurista" possivelmente a palavra não existe, e escrevi-a como vinda de "figura", que é o que sou, fazedor de figuras.

francisco, que ideia foi essa, que agradeço? pragmático como sou, fiz logo as duas perguntas lógicas e decorrentes: vou ser despedido do blog? vou morrer?
francisco disse…
Meu amigo, tendo sido suspensa a edição da Agenda 5entidos, onde se publicavam as entrevistas "Gente de Cá", foi ensaiado o mesmo figurino (modelo) para uma edição online onde se desse continuidade a essa rubrica. No final do período de avaliação desse projecto concluiu-se que o mesmo não tinha o alcance nem o impacto da versão impressa, pelo que foi decidido suspendê-lo, e com ele a rubrica "Coisas de Cá".

Como achei que seria um desperdício fazer desaparecer simplesmente os quatro artigos produzidos nesses três meses, decidi republicá-los em vários blogs (acção permitida e encorajada a qualquer internauta já que as produções da instituição só têm a ganhar com a sua ampla divulgação). Nesse pressuposto acho que o blog Lagos é o mais adequado para deixar este trabalho acessível na net. E não é necessário explicar porquê.

Quando ao título, ele foi assim criado e publicado pela Alexandra, como resultado da interpretação das suas palavras. Pessoalmente acho que Figurinista é o termo existente que mais se aproxima da ideia de alguém que trabalha modelos/ figuras, e se não é, duvido que o termo figurista o seja, senão vejamos:
FIGURISTA
1. adepto do figurismo (sistema dos que interpretam alegoricamente a Bíblia)
2. pessoa que se serve de figuras para descrever os factos

Despedido do blog, não, que eu e Zé Francisco não deixamos. Mas receio que não possamos garantir o mesmo quanto à morte (venha ela longe, cega e lenta).
;)
Abraço.
francisco disse…
Sobre as datas erradas, acha que se deve alterar o texto ou a correcção deixada pelo seu comentário é suficiente?

Ainda sobre "figurinista", se o termo usado no título não explica com exactidão, o texto fá-lo, e logo no primeiro parágrafo, não?!
deodato santos disse…
nem fui verificar a dicionário, deixei-me levar pelo mais comum, ligado à moda. tal como as datas, são pormenores,não vale a pena estar a rectificar.e os meus cumprimentos a
Alexandra pelo texto e a si pelas fotos.
RÉJO MARPA disse…
Figurinista? Figurista? O que interessa? Uma FIGURA, concerteza!
Unknown disse…
Deodato foi bom saber de ti . Um abraço
Unknown disse…
Deodato, não nos vemos há mais de muitos anos. Sou a Fátima, alentejana, e fiz estágio profissional na mesma escola e no mesmo ano que tu. Vivo agora em Vila Real de Santo António. Gostaria de te rever. O meu tlm é 966624439. Diz alguma coisa.

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